11 de mai. de 2007

Discurso do Papa aos Jovens


Estádio do Pacaembu – São Paulo – Brasil 10/05/07

Queridos jovens! Queridos amigos e amigas!

"Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá o dinheiro aos pobres [...] Depois, vem e segue-me" (Mt 19,21).

1. Desejei ardentemente encontrar-me convosco nesta minha primeira viagem à América Latina. Vim para abrir a V Conferência do Episcopado Latino-americano que, por meu desejo, vai realizar-se em Aparecida, aqui no Brasil, no Santuário de Nossa Senhora. Ela nos coloca aos pés de Jesus para aprendermos suas lições sobre o Reino e impulsionar-nos a ser seus missionários, para que os povos deste "Continente da Esperança" tenham, n'Ele, vida plena.

Os vossos Bispos do Brasil, na sua Assembléia Geral do ano passado, refletiram sobre o tema da evangelização da juventude e colocaram em vossas mãos um documento. Pediram que fosse acolhido e aperfeiçoado por vós durante todo o ano. Nesta última Assembléia retomaram o assunto, enriquecido com vossa colaboração, e desejam que as reflexões feitas e as orientações propostas sirvam como incentivo e farol para vossa caminhada.

As palavras do Arcebispo de São Paulo e do encarregado da Pastoral da Juventude, as quais agradeço, bem atestam o espírito que move a todos vocês. Ontem pela tarde, ao sobrevoar o território brasileiro, pensava já neste nosso encontro no Estádio do Pacaembu, com o desejo de dar um grande abraço bem brasileiro a todos vós, e manifestar os sentimentos que levo no íntimo do coração e que, bem a propósito, o Evangelho de hoje nos quis indicar.

Sempre experimentei uma alegria muito especial nestes encontros. Lembro me particularmente da Vigésima Jornada Mundial da Juventude, que tive a ocasião de presidir há dois anos atrás na Alemanha. Alguns dos que estão aqui também lá estiveram! É uma lembrança comovedora, pelos abundantes frutos da graça enviados pelo Senhor.

E não resta a menor dúvida que o primeiro fruto, dentre muitos, que pude constatar foi o da fraternidade exemplar havida entre todos, como demonstração evidente da perene vitalidade da Igreja por todo o mundo.

2. Pois bem, caros amigos, estou certo de que hoje se renovam as mesmas impressões daquele meu encontro na Alemanha. Em 1991, o Servo de Deus, o Papa João Paulo II, de venerada memória, dizia, na sua passagem pelo Mato Grosso, que os "jovens são os primeiros protagonistas do terceiro milênio [...] são vocês que vão traçar os rumos desta nova etapa da humanidade" (Discurso 16/10/1991). Hoje, sinto-me movido a fazer-lhes idêntica observação.

O Senhor aprecia, sem dúvida, vossa vivência cristã nas numerosas comunidades paroquiais e nas pequenas comunidades eclesiais, nas Universidades, Colégios e Escolas e, especialmente, nas ruas e nos ambientes de trabalho das cidades e dos campos. Trata-se, porém, de ir adiante.
Nunca podemos dizer basta, pois a caridade de Deus é infinita e o Senhor nos pede, ou melhor, nos exige dilatar nossos corações para que neles caiba sempre mais amor, mais bondade, mais compreensão pelos nossos semelhantes e pelos problemas que envolvem não só a convivência humana, mas também a efetiva preservação e conservação da natureza, da qual todos fazem parte.

"Nossos bosques têm mais vida": não deixeis que se apague esta chama de esperança que o vosso Hino Nacional põe em vossos lábios. A devastação ambiental da Amazônia e as ameaças à dignidade humana de suas populações requerem um maior compromisso nos mais diversos espaços de ação que a sociedade vem solicitando.

3. Hoje quero convosco refletir sobre o texto de São Mateus (19, 16-22), que acabamos de ouvir. Fala de um jovem. Ele veio correndo ao encontro de Jesus. Merece destaque a sua ânsia. Neste jovem vejo a todos vós, jovens do Brasil e da América Latina. Viestes correndo de diversas regiões deste Continente para nosso encontro. Quereis ouvir, pela voz do Papa, as palavras do próprio Jesus.

Tendes uma pergunta crucial, referida no Evangelho, a Lhe fazer. É a mesma do jovem que veio correndo ao encontro com Jesus: o que fazer para alcançar a vida eterna?

Gostaria de aprofundar convosco esta pergunta. Trata-se da vida. A vida que, em vós, é exuberante e bela. O que fazer dela? Como vivê-la plenamente?

Logo entendemos, na formulação da própria pergunta, que não basta o aqui e agora, ou seja, nós não conseguimos delimitar nossa vida ao espaço e ao tempo, por mais que pretendamos estender seus horizontes. A vida os transcende.

Em outras palavras, queremos viver e não morrer. Sentimos que algo nos revela que a vida é eterna e que é necessário empenhar-se para que isto aconteça. Em outras palavras, ela está em nossas mãos e depende, de algum modo, da nossa decisão.

A pergunta do Evangelho não contempla apenas o futuro. Não trata apenas de uma questão sobre o que acontecerá após a morte. Há, ao contrário, um compromisso com o presente, aqui e agora, que deve garantir autenticidade e conseqüentemente o futuro. Numa palavra, a pergunta questiona o sentido da vida.

Pode por isso ser formulada assim: que devo fazer para que minha vida tenha sentido? Ou seja: como devo viver para colher plenamente os frutos da vida? Ou ainda: que devo fazer para que minha vida não transcorra inutilmente? Jesus é o único capaz de nos dar uma resposta, porque é o único que nos pode garantir vida eterna. Por isso também é o único que consegue mostrar o sentido da vida presente e dar-lhe um conteúdo de plenitude.

4. Antes, porém, de dar sua resposta, Jesus questiona a pergunta do jovem num aspecto muito importante: por que me chamas de bom? Nesta pergunta se encontra a chave da resposta. Aquele jovem percebeu que Jesus é bom e que é mestre. Um mestre que não engana.

Nós estamos aqui porque temos esta mesma convicção: Jesus é bom. Podemos não saber dar toda a razão desta percepção, mas é certo que ela nos aproxima dele e nos abre ao seu ensinamento: um mestre bom. Quem reconhece o bem é sinal que ama. E quem ama, na feliz expressão de São João, conhece Deus (cf.1Jo 4,7).

O jovem do Evangelho teve uma percepção de Deus em Jesus Cristo. Jesus nos garante que só Deus é bom. Estar aberto à bondade significa acolher Deus. Assim Ele nos convida a ver Deus em todas as coisas e em todos os acontecimentos, mesmo lá onde a maioria só vê a ausência de Deus. Vendo a beleza das criaturas e constatando a bondade presente em todas elas, é impossível não crer em Deus e não fazer uma experiência de sua presença salvífica e consoladora.

Se nós conseguíssemos ver todo o bem que existe no mundo e, ainda mais, experimentar o bem que provém do próprio Deus, não cessaríamos jamais de nos aproximar dele, de O louvar e Lhe agradecer. Ele continuamente nos enche de alegria e de bens. Sua alegria é nossa força.

Mas nós não conhecemos senão de forma parcial. Para perceber o bem necessitamos de auxílios, que a Igreja nos proporciona em muitas oportunidades, principalmente pela catequese. Jesus mesmo explicita o que é bom para nós, dando-nos sua primeira catequese. «Se queres entrar na vida, observa os mandamentos» (Mt 19,17).
Ele parte do conhecimento que o jovem já obteve certamente de sua família e da Sinagoga: de fato, ele conhece os mandamentos. Eles conduzem à vida, o que equivale a dizer que eles nos garantem autenticidade. São as grandes balizas a nos apontarem o caminho certo.

Quem observa os mandamentos está no caminho de Deus. Não basta conhecê-los. O testemunho vale mais que a ciência, ou seja, é a própria ciência aplicada. Não são impostos de fora, nem diminuem nossa liberdade. Pelo contrário: constituem impulsos internos vigorosos, que nos levam a agir nesta direção. Na sua base está a graça e a natureza, que não nos deixam parados. Precisamos caminhar. Somos impelidos a fazer algo para nos realizarmos a nós mesmos.

Realizar-se, através da ação, na verdade, é tornar-se real. Nós somos, em grande parte, a partir de nossa juventude, o que nós queremos ser. Somos, por assim dizer, obra de nossas mãos.

5. Nesta altura volto-me, de novo, para vós, jovens, querendo ouvir também de vós a resposta do jovem do Evangelho: tudo isto tenho observado desde a minha juventude. O jovem do Evangelho era bom. Observava os mandamentos. Estava pois no caminho de Deus. Por isso Jesus fitou-o com amor. Ao reconhecer que Jesus era bom, testemunhou que também ele era bom. Tinha uma experiência da bondade e por isso, de Deus.

E vós, jovens do Brasil e da América Latina? Já descobristes o que é bom? Seguis os mandamentos do Senhor? Descobristes que este é o verdadeiro e único caminho para a felicidade? Os anos que vós estais vivendo são os anos que preparam o vosso futuro. O "amanhã" depende muito de como estais vivendo o "hoje" da juventude. Diante dos olhos, meus queridos jovens, tendes uma vida que desejamos seja longa; mas é uma só, é única: não a deixeis passar em vão, não a desperdiceis. Vivei com entusiasmo, com alegria, mas, sobretudo, com senso de responsabilidade.

Muitas vezes sentimos trepidar nossos corações de pastores, constatando a situação de nosso tempo. Ouvimos falar dos medos da juventude de hoje. Revelam-nos um enorme déficit de esperança: medo de morrer, num momento em que a vida está desabrochando e procura encontrar o próprio caminho da realização; medo de sobrar, por não descobrir o sentido da vida; e medo de ficar desconectado diante da estonteante rapidez dos acontecimentos e das comunicações. Registramos o alto índice de mortes entre os jovens, a ameaça da violência, a deplorável proliferação das drogas que sacode até a raiz mais profunda a juventude de hoje. Fala-se por isso, seguidamente, de uma juventude perdida.

Mas olhando para vós, jovens aqui presentes, que irradiais alegria e entusiasmo, assumo o olhar de Jesus: um olhar de amor e confiança, na certeza de que vós encontrastes o verdadeiro caminho. Sois jovens da Igreja. Por isso Eu vos envio para a grande missão de evangelizar os jovens e as jovens, que andam por este mundo errantes, como ovelhas sem pastor.

Sede os apóstolos dos jovens. Convidai-os para que venham convosco, façam a mesma experiência de fé, de esperança e de amor; encontrem-se com Jesus, para se sentirem realmente amados, acolhidos, com plena possibilidade de realizar-se. Que também eles e elas descubram os caminhos seguros dos Mandamentos e por eles cheguem até Deus. Podeis ser protagonistas de uma sociedade nova se procurais pôr em prática uma vivência real inspirada nos valores morais universais, mas também um empenho pessoal de formação humana e espiritual de vital importância.

Um homem ou uma mulher despreparados para os desafios reais de uma correta interpretação da vida cristã do seu meio ambiente será presa fácil a todos os assaltos do materialismo e do laicismo, sempre mais atuantes em todos os níveis.

Sede homens e mulheres livres e responsáveis; fazei da família um foco irradiador de paz e de alegria; sede promotores da vida, do início ao seu natural declínio; amparai os anciãos, pois eles merecem respeito e admiração pelo bem que vos fizeram. O Papa também espera que os jovens procurem santificar seu trabalho, fazendo-o com competência técnica e com laboriosidade, para contribuir ao progresso de todos os seus irmãos e para iluminar com a luz do Verbo todas as atividades humanas (cf. Lumen Gentium, n. 36).

Mas, sobretudo, o Papa espera que saibam ser protagonistas de uma sociedade mais justa e mais fraterna, cumprindo as obrigações frente ao Estado: respeitando as suas leis; não se deixando levar pelo ódio e pela violência; sendo exemplo de conduta cristã no ambiente profissional e social, distinguindo-se pela honestidade nas relações sociais e profissionais. Tenham em conta que a ambição desmedida de riqueza e de poder leva à corrupção pessoal e alheia; não existem motivos para fazer prevalecer as próprias aspirações humanas, sejam elas econômicas ou políticas, com a fraude e o engano.

Definitivamente, existe um imenso panorama de ação no qual as questões de ordem social, econômica e política ganham um particular relevo, sempre que haurirem sua fonte de inspiração no Evangelho e na Doutrina Social da Igreja.

A construção de uma sociedade mais justa e solidária, reconciliada e pacífica; a contenção da violência e as iniciativas que promovam a vida plena, a ordem democrática e o bem comum e, especialmente, aquelas que visem eliminar certas discriminações existentes nas sociedades latino-americanas e não são motivo de exclusão, mas de recíproco enriquecimento.

Tende, sobretudo, um grande respeito pela instituição do Sacramento do Matrimônio. Não poderá haver verdadeira felicidade nos lares se, ao mesmo tempo, não houver fidelidade entre os esposos. O matrimônio é uma instituição de direito natural, que foi elevado por Cristo à dignidade de Sacramento; é um grande dom que Deus fez à humanidade. Respeitai-o, venerai-o. Ao mesmo tempo, Deus vos chama a respeitar-vos também no namoro e no noivado, pois a vida conjugal que, por disposição divina, está destinada aos casados é somente fonte de felicidade e de paz na medida em que souberdes fazer da castidade, dentro e fora do matrimônio, um baluarte das vossas esperanças futuras.

Repito aqui para todos vós que «o eros quer nos conduzir para além de nós próprios, para Deus, mas por isso mesmo requer um caminho de ascese, renúncias, purificações e saneamentos» (Carta encl. Deus caritas est, (25/12/2005), n. 5). Em poucas palavras, requer espírito de sacrifício e de renúncia por um bem maior, que é precisamente o amor de Deus sobre todas as coisas.

Procurai resistir com fortaleza às insídias do mal existente em muitos ambientes, que vos leva a uma vida dissoluta, paradoxalmente vazia, ao fazer perder o bem precioso da vossa liberdade e da vossa verdadeira felicidade. O amor verdadeiro "procurará sempre mais a felicidade do outro, preocupar-se-á cada vez mais dele, doar-se-á e desejará existir para o outro" (Ib. n. 7) e, por isso, será sempre mais fiel, indissolúvel e fecundo.

Para isso, contais com a ajuda de Jesus Cristo que, com a sua graça, fará isto possível (cf. Mt 19,26). A vida de fé e de oração vos conduzirá pelos caminhos da intimidade com Deus, e de compreensão da grandeza dos planos que Ele tem para cada um. "Por amor do reino dos céus" (ib., 12), alguns são chamados a uma entrega total e definitiva, para consagrarse a Deus na vida religiosa, "exímio dom da graça", como foi definido pelo Concílio Vaticano II (Decr. Perfectae caritatis, n.12).

Os consagrados que se entregam totalmente a Deus, sob a moção do Espírito Santo, participam na missão de Igreja, testemunhando a esperança no Reino celeste entre todos os homens. Por isso, abençôo e invoco a proteção divina a todos os religiosos que dentro da seara do Senhor se dedicam a Cristo e aos irmãos. As pessoas consagradas merecem, verdadeiramente, a gratidão da comunidade eclesial: monges e monjas, contemplativos e contemplativas, religiosos e religiosas dedicados às obras de apostolado, membros de institutos seculares e das sociedades de vida apostólica, eremitas e virgens consagradas. "A sua existência dá testemunho do amor a Cristo quando eles se encaminham pelo seu seguimento, tal como este se propõe no Evangelho e, com íntima alegria, assumem o mesmo estilo de vida que Ele escolheu para Si" (Congr. para os Inst. de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica: Instr. Partir de Cristo, n. 5).

Faço votos de que, neste momento de graça e de profunda comunhão em Cristo, o Espírito Santo desperte no coração de tantos jovens um amor apaixonado no seguimento e imitação de Jesus Cristo casto, pobre e obediente, voltado completamente à glória do Pai e ao amor dos irmãos e irmãs.

6. O Evangelho nos assegura que aquele jovem, que veio correndo ao encontro de Jesus, era muito rico. Entendemos esta riqueza não apenas no plano material. A própria juventude é uma riqueza singular. É preciso descobri-la e valorizá-la. Jesus lhe deu tal valor que convidou esse jovem para participar de sua missão de salvação. Tinha todas as condições para uma grande realização e uma grande obra. Mas o Evangelho nos refere que esse jovem se entristeceu com o convite. Foi embora abatido e triste.

Este episódio nos faz refletir mais uma vez sobre a riqueza da juventude. Não se trata, em primeiro lugar, de bens materiais, mas da própria vida, com os valores inerentes à juventude. Provém de uma dupla herança: a vida, transmitida de geração em geração, em cuja origem primeira está Deus, cheio de sabedoria e de amor; e a educação que nos insere na cultura, a tal ponto que, em certo sentido, podemos dizer que somos mais filhos da cultura e por isso da fé, do que da natureza. Da vida brota a liberdade que, sobretudo nesta fase se manifesta como responsabilidade. E o grande momento da decisão, numa dupla opção: uma quanto ao estado de vida e outra quanto à profissão. Responde à questão: que fazer com a vida?

Em outras palavras, a juventude se afigura como uma riqueza porque leva à descoberta da vida como um dom e como uma tarefa. O jovem do Evangelho percebeu a riqueza de sua juventude. Foi até Jesus, o Bom Mestre, para buscar uma orientação. Mas na hora da grande opção não teve coragem de apostar tudo em Jesus Cristo. Conseqüentemente saiu dali triste e abatido. É o que acontece todas as vezes que nossas decisões fraquejam e se tornam mesquinhas e interesseiras. Sentiu que faltou generosidade, o que não lhe permitiu uma realização plena. Fechou-se sobre sua riqueza, tornando-a egoísta.

Jesus ressentiu-se com a tristeza e a mesquinhez do jovem que o viera procurar. Os Apóstolos, como todos e todas vós hoje, preenchem esta lacuna deixada por aquele jovem que se retirou triste e abatido. Eles e nós estamos alegres porque sabemos em quem acreditamos (2 Tim 1,12). Sabemos e testemunhamos com nossa própria vida que só Ele tem palavras de vida eterna (Jo 6,68). Por isso, com São Paulo, podemos exclamar: alegrai-vos sempre no Senhor (Fil 4,4).

7. Meu apelo de hoje, a vós jovens, que viestes a este encontro, é que não desperdiceis vossa juventude. Não tenteis fugir dela. Vivei-a intensamente. Consagrai-a aos elevados ideais da fé e da solidariedade humana. Vós, jovens, não sois apenas o futuro da Igreja e da humanidade, como uma espécie de fuga do presente.

Pelo contrário: vós sois o presente jovem da Igreja e da humanidade. Sois seu rosto jovem. A Igreja precisa de vós, como jovens, para manifestar ao mundo o rosto de Jesus Cristo, que se desenha na comunidade cristã. Sem o rosto jovem a Igreja se apresentaria desfigurada.

Queridos jóvenes, dentro de poco inauguraré la Quinta Conferencia del Episcopado Latinoamericano. Os pido que sigáis con atención sus trabajos; que participéis en sus debates; que recéis por sus frutos. Como ocurrió con las Conferencias anteriores, también ésta marcará de modo significativo los próximos diez años de Evangelización en América Latina y en el Caribe.

Nadie debe quedar al margen o permanecer indiferente ante este esfuerzo de la Iglesia, y mucho menos los jóvenes. Vosotros con todo derecho formáis parte de la Iglesia, la cual representa el rostro de Jesucristo para América Latina y el Caribe.

Je salue les francophones qui vivent sur le Continent latino-américain, les invitant à être des témoins de l'Évangile et des acteurs de la vie ecclésiale. Ma prière vous rejoint tout particulièrement, vous les jeunes, vous êtes appelés à construire votre vie sur le Christ et sur les valeurs humaines fondamentales. Que tous se sentent invités à collaborer pour édifier un monde de justice et de paix.

Dear young friends, like the young man in the Gospel, who asked Jesus "what must I do to have eternal life?", all of you are searching for ways of responding generously to God's call. I pray that you may hear his saving word and become his witnesses to the people of today. May God pour out upon all of you his blessings of peace and joy.

Queridos jovens, Cristo vos chama a serem santos. Ele mesmo vos convoca e quer andar convosco, para animar com Seu espírito os passos do Brasil neste início do terceiro milênio da era cristã. Peço à Senhora Aparecida que vos conduza, com seu auxílio materno e vos acompanhe ao longo da vida.

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

10 de mai. de 2007

Discurso do Papa em Guarulhos


Excelentíssimo Senhor Presidente da República
Senhores Cardeais e Venerados Irmãos no Episcopado
Queridos Irmãos e Irmãs em Cristo!

É para mim motivo de particular satisfação iniciar minha Visita Pastoralao Brasil e apresentar a Vossa Excelência, na sua qualidade de Chefe e representante supremo da grande Nação brasileira, os meus agradecimentos pela amável acolhidaque me foi dispensada. Um agradecimento que estendo, com muito prazer, aosmembros do Governo que acompanham Vossa Excelência, às personalidades civis e militares aqui reunidos e às autoridades do Estado de São Paulo. Nas palavras de boas-vindas a mim dirigidas, sinto ecoar, Senhor Presidente, os sentimentosde carinho e amor de todo o Povo brasileiro para com o Sucessor do Apóstolo Pedro.

Saúdo fraternalmente no Senhor os meus queridos Irmãos no Episcopado queaqui vieram para me receber em nome da Igreja que está no Brasil. Saúdo igualmenteos sacerdotes, os religiosos e as religiosas, os seminaristas e os leigos comprometidos com a obra de evangelização da Igreja e com o testemunho deuma vida autenticamente cristã. Enfim, dirijo a minha afetuosa saudação atodos os brasileiros sem distinção, homens, mulheres, famílias, anciãos,enferemos, jovens e crianças. A todos digo de coração: Muito obrigado pelavossa generosa hospitalidade!

O Brasil ocupa um lugar muito especial no coração do Papa não somente porquenasceu cristão e possui hoje o mais alto número de católicos, mas sobretudo porque é uma nação rica de potencialidades com uma presença eclesial queé motivo de alegria e esperança para toda Igreja. A minha visita, Senhor Presidente, tem um objetivo que ultrapassa as fronteiras nacionais: venho presidir, em Aparecida, a sessão de abertura da V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho. Por uma providencial manifestação da bondadedo Criador, este País deverá servir de berço para as propostas eclesiais que, Deus queira, poderão dar um novo vigor e impuslo missionário a este Continente.

Nesta área geográfica os católicos são maioria: isto significa que eles devem contribuir de modo particular ao serviço do bem comum desta Nação. A solidariedade será, sem dúvida, palavra cheia de conteúdo quando as forças vivas da sociedade, cada qual dentro do seu próprio âmbito, se empenharem seriamente para construirum futuro de paz e de esperança para todos.

A Igreja Católica - como coloquei em evidência na Encíclica Deus caritas est - "transformada pela força do Espírito é chamada para ser, no mundo, testemunha do amor do Pai, que quer fazer da humanidade uma única família,em seu Filho" (c.f.19). Daí o seu profundo compromisso com a missão evangelizadora, a serviço da causa da paz e da justiça. A decisão, portanto, de realizar uma Conferência essencialmente missionária, bem reflete a preocupação do episcopado, e não menos a minha, de procurar caminhos adequados para que, em Jesus Cristo, os "nossos povos tenham vida", como reza o tema da Conferência. Com esses sentimentos, quero olhar para além das fronteiras deste País e saudar todos os povos da América Latina e do Caribe desejando, com as palavras do Apóstolo, "Que a paz esteja com todos vós que estais em Cristo" (1 Pt5,14).

Sou grato, Senhor Presidente, à Divina Providência que me concede a graçade visitar o Brasil, um País de grande tradição católica. Já tive oportunidade de referir o motivo principal da minha viagem que tem um alcance latino-americano e um caráter essencialmente religioso.

Estou muito feliz de poder passar alguns dias com os brasileiros. Sei que a alma deste Povo, bem como de toda a América Latina, conserva valores radicalmente cristãos que jamais serão cancelados. E estou certo que em Aparecida, durante a Conferência Geral do Episcopado, será reforçada tal identidade, ao promover o respeito pela vida, desde a sua concepção até o seu natural declínio, como exigência própria da natureza humana; fará também da promoção da pessoa humana o eixo da solidariedade, especialmente com os pobres e desamparados.

A Igreja quer apenas indicar os valores morais de cada situação e formar os cidadãos para que possam decidir consciente e livremente; neste sentido, não deixará de insistir no empenho que deverá ser dado para assegurar o fortalecimento da família - como célula mãe da sociedade; da juventude - cuja formação constitui fator decisivo para o futuro de uma Nação - e finalmente, mas não por último, defendendo e promovendo os valores subjacentes em todos os segmentos da sociedade, especialmente dos povos indígenas.
Com estes auspícios, ao renovar os meus agradecimentos pela calorosa acolhida que, como Sucessor de Pedro, sou objeto, invoco a proteção materna de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, evocada também como Nuestra Señora de Guadalupe, padroeira das Américas, para que proteja e inspire os governantes an árduatarefa de serem promotores do bem comum, reforçando os laços de fraternidade cristã para o bem de todos os seus cidadãos. Deus abençoe a América Latina! Deus abençoe o Brasil! Muito obrigado.

9 de mai. de 2007

Bem-Vindo, Papa Bento XVI!

A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB) saúda o Papa Bento XVI na sua chegada ao Brasil, chamando-o bem-vindo como autoridade máxima da Igreja Católica Apostólica Romana, representada em nosso país por um tão grande número de fiéis.

Ao mesmo tempo em que dá as boas vindas ao Papa Bento XVI, a IELB reafirma o que pensa da importância de um papa para uma igreja. Cada papa será sempre respeitado pela IELB na função que exerce. O respeito devido, todavia, jamais chegará ao ponto de considerá-lo chefe supremo de toda a cristandade, visto que é autoridade sobre uma parte da cristandade, ou seja, os fiéis da Igreja Católica Apostólica Romana.

A IELB também expressa sua discordância em relação a qualquer manifestação popular ou oficial que se dirija ao papa como "santo padre", visto que a santidade de qualquer um, seja papa, padre ou pastor, é igual em todos aqueles que confiam em Jesus Cristo como Salvador. Por meio da fé em Jesus, recebem Dele a santidade que jamais será alcançada por qualquer obra ou merecimento humanos. É a justiça e santidade de Jesus, o Filho de Deus, que deixa santos diante de Deus todos aqueles que confessam sua confiança na salvação trazida à humanidade por Cristo. Por tal razão, não existe entre os seres humanos alguém mais santo do que outro, não importa a função ou cargo que desempenhe dentro de uma hierarquia eclesiástica.

A IELB deseja ao Papa Bento XVI a constante iluminação do Espírito Santo para que ele, valendo-se dos recursos de que dispõe para se manifestar, possa transmitir o que o Senhor Jesus espera dos seus apóstolos. A palavra de Jesus continua sendo a única luz para o mundo em trevas, por isso possa Bento XVI confessá-la e anunciá-la a fim de que multidões conheçam o que o Salvador afirma em João 14.6: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim.


Rev. Paulo Moisés Nerbas
Pastor Presidente da Igreja Evangélica Luterana do Brasil

7 de mai. de 2007

Bento XVI, crítico da cultura

O que levou Bento XVI ao supremo pontificado foi o fato de ser um eminente doutor e não um conhecido pastor. Representa o típico teólogo acadêmico alemão, cuja faculdade de teologia se situa no interior da universidade do Estado. É a primeira entre todas as faculdades o que lhe permite um discurso transversal, em permanente diálogo com outros saberes. Tal fato confere à teologia em estilo alemão alto nível de criticidade e até uma discreta arrogância de ser a mais profunda e filosofante de todas na Igreja, a ponto de Lutero, ainda em seu tempo, poder dizer que "um doutor romano é um asno germano".Como teólogo acadêmico, Joseph Ratzinger se envolveu ativamente nas discussões sobre a identidade européia e sobre os desafios a modernidade. É neste campo que se revela o alcance e também o limite de sua fecunda produção intelectual. Normalmente é assim como os filósofos do conhecimento nos ensinam que a cabeça pensa a partir de onde os pés pisam e o que cada ponto de vista é a vista de um ponto. Onde pisam os pés do intelectual Ratzinger e que vista seu ponto permite? Indiscutivelmente ele pisa o espaço cultural da Europa central, portanto, a partir do grupo de paises hegemônicos no mundo e sua vista depende daquele ponto a partir do qual vê o mundo e a Igreja.Com efeito,não vê na ótica dos pobres e dos oprimidos. O que pesa em seu pensamento é o lastro cultural formado na escola de Santo Agostinho(+450) e de São Boaventura(+1274), sobre os quais escreveu duas brilhantes teses. Ambos têm isso em comum: o mundo é uma arena onde se enfrenta Deus e o diabo, a graça e a natureza, a cidade de Deus e a cidade dos homens. O pecado das origens produziu uma tragédia na condição humana: esta ficou tão decadente que sozinha não consegue se redimir e produzir uma obra que agrade a Deus. Precisa do Redentor, Jesus, que é continuado pela Igreja, dotada com todos os meios de salvação. Sem a mediação da Igreja, os valores culturais valem mas não o suficiente para salvarem o ser humano e sua história. O mesmo se aplica à libertação de nossa teologia. Este tipo de teologia leva a a uma leitura pessimista da cultura. Isso se percebe na leitura que o teólogo Ratzinger faz da modernidade. Nela vê antes de tudo arrogância, relativismo, materialismo e ateismo, esforço humano em busca de emancipação por seus próprios meios. Missão da Igreja é desmascarar esta pretensão, levar-lhe clareza de princípios, segurança na obscuridade e verdades absolutamente válidas. Esta teologia contém muito de verdade, pois há efetivamente decadência na modernidade. Mas esta não poupa também a Igreja que é feita de justos e pecadores. Entretanto, importa alargar o horizonte teológico. Faz-se mister inserir junto com Cristo uma teologia do Espírito Santo, praticamente, ausente em Santo Agostinho e no teólogo Ratzinger. Uma teologia do Espírito permetiria ver no mundo moderno, como fez o Concílio Vaticano II (1965) grandes valores como os direitos humanos, a democracia, o trabalho, a ciência e a técnica. Do anátema a Igreja passaria ao diálogo. Associar-se-ia a todos os seres humanos de boa vontade para buscar uma verdade mais plena, pois o Verbo "ilumina a cada pessoa que vem a este mundo" e o "Espírito enche a face da Terra" como dizem as Escrituras judaico-cristãs. Como o Papa é sumamente inteligente pode bem ser que, face à nossa realidade, veja o que de bom está sendo feito para tirar as pessoas das consequências de uma perversa modernidade que negou a tantos milhões os direitos,a justiça e a vida.
Leonardo Boff

6 de mai. de 2007

Uma Nova Canção…

Tenho aprendido e tentado aplicar à minha vida a política do silêncio. Acho que a experiência me ensinou que em determinados momentos o gesto silente é muito mais eficaz do que dar vazão a palavras pois estas, muitas vezes, vêm acompanhadas de sentimentos nem sempre nobres...
Mas, diante de algumas questões, principalmente aquelas que envolvem princípios, questões de caráter, respeito, virtudes básicas que pelo menos nos meus áureos tempos de escola ainda nos ensinavam, é impossível ceder, e as palavras tornam-se armas poderosas, aliadas na luta por um mundo justo, um mundo melhor.
Hoje, elas tomam vazão em defesa de alguém que sequer conheço, mas as vestes da justiça não têm olhos, e nem estes são necessários pois a consciência é algo que nos fala com sapiência e neste instante a balança da revolta pesa mais que a da indiferença, já que esta canção que hoje ouvi não é tão nova assim...
Hoje contamos com inúmeros meios de comunicação, uma evolução louvável, mas que precisa ser disciplinada, como tudo na vida, uma vez que liberdade em excesso acaba se transformando em anarquia.
Nem tudo que se prega, fala, nem tudo na vida é 100% bom ou ruim, com algumas exceções neste “reino tão universal”... Metáforas à parte, voltemos ao cerne na questão...
Há anos uma mesma canção toca no rádio e na TV... E a cada dia seu coro se enche de vozes, silenciando outras apenas por ter mais potência. Nada de errado, o ser humano é livre, até mesmo para escolher ser escravo novamente, escravo desta canção que soa como um disco arranhado, cantarolando as mesmas melodias, melodias que soam como sofismas diante de tão deturpada imagem de que apenas naquele pedaço de céu existe salvação.
Mas que $anto$ são esses? $anto$ que falam por Deus, que sabem de suas vontades? Que acreditam que a morte é uma forma de retirar do cenário alguém que os incomode, alguém que não testemunha da mesma loucura e alienação? Que vêm a morte como um castigo, e não como a porta para a vida eterna? $anto$ que se julgam Deus... Anjos que se julgaram Deus... Acho que podemos estabelecer aqui um paralelo...
Hoje a canção que me revolta é a da leviandade... dos $anto$ da nova meca que, em busca de Ibope e de novos sócios jogam palavras em rede nacional como se estivessem a ler uma receita de bolo. Usam neologismos, descartam a filosofia, a teologia, acreditam que seus escritos de ABC, meros manuais de auto-ajuda, são superiores que as próprias Encíclicas Papais. Reduziram a igreja a acampamentos, onde legiões de pessoas vão em busca de cura e libertação, distorceram a liturgia, transformaram o altar num palco para seus shows, transformaram os templos em galpões...
O que ainda está por vir? Acho que só mesmo eles sabem, já que assumiram o papel de canal aberto com Deus...
Waleska Melo

Mentira global

Os países comprometidos com o combate às mudanças climáticas estabeleceram metas equivocadas. E sabem disso...
George Monbiot, THE GUARDIAN

Os países ricos que estão querendo impedir as mudanças climáticas têm em comum o seguinte - eles mentem. Vocês não encontrarão essa afirmação na minuta do novo relatório preparado pelo Comitê Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change). Mas, assim que entender os números, terá a verdade diante dos olhos. Os governos que fazem esforços genuínos para lutar contra o aquecimento global usam números que sabem serem falsos.
O governo britânico, a União Européia e a ONU, todos alegam estar tentando impedir mudanças climáticas “perigosas”. Qualquer alteração climática é perigosa para alguém, mas há amplo consenso sobre o que essa expressão significa - 2 graus de aquecimento acima dos níveis pré-industriais. É perigoso por causa do seu impacto sobre as pessoas e os lugares (pode, por exemplo, desencadear um derretimento irreversível da cobertura de gelo da Groenlândia e o colapso da floresta tropical da Amazônia) e, como tende a estimular mais aquecimento, incentiva os sistemas naturais do mundo a liberar gases de efeito estufa.
O objetivo de impedir um aquecimento superior a 2°C foi adotado abertamente pela ONU e pela União Européia e implicitamente pelos governos britânico, alemão e sueco. Todos disseram esperar restringir a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera a um nível que venha a impedir tal elevação. E todos eles sabem que estabeleceram metas erradas, baseadas em dados científicos obsoletos. Temerosos das implicações políticas, não ajustaram suas metas à exigência das novas pesquisas.
A temperatura média global é afetada pela concentração de gases de efeito estufa na atmosfera. Essa concentração é geralmente expressa como “o equivalente em dióxido de carbono”. Não é uma ciência exata - é impossível dizer que uma determinada concentração de gases resultará num determinado aumento da temperatura -, mas os cientistas tratam a relação em termos de probabilidade. Documento publicado em 2006 pelo climatologista Malte Meinshausen sugere que, se os gases de efeito estufa atingirem a concentração de 550 partes por milhão, em equivalente a dióxido de carbono, há uma chance de 63% a 99% (com uma média de 82%) de que o aquecimento global ultrapasse os 2 graus. Com 475 partes por milhão (ppm), a probabilidade média é de 64%. Apenas se as concentrações forem estabilizadas em 400 partes por milhão (ou menos) é que diminuem muito as chances (em média de 28%) de que as temperaturas se elevem em mais de 2 graus.
A minuta do relatório do IPCC contém números parecidos. Uma concentração de 510 ppm nós dá uma chance de 33% de impedir um aquecimento de mais de 2°C. Uma concentração de 590 ppm nós dá 10% de chance. Você começa a entender a proporção do desafio quando descobre que o nível atual de gases de efeito estufa na atmosfera (usando a fórmula da IPCC) é de 459 partículas por milhão. Ou seja, já ultrapassamos o nível seguro. Para nos dar a uma alta chance de impedir alterações climáticas perigosas, precisamos o quanto antes de um programa tão drástico que os gases de efeito estufa na atmosfera fiquem abaixo das concentrações atuais.
Mas nenhum governo se propôs a essa tarefa. A União Européia e o governo sueco estabeleceram a meta mais rigorosa do mundo. É de 550 ppm, o que nós dá uma quase certeza de mais 2°C. O governo britânico lança mão de truque de magia. Seu objetivo é também “550 partes por milhão”, mas 550 partes somente de dióxido de carbono. Quando incluímos os outros gases de efeito estufa, isso se traduz por 666 ppm, em equivalente ao dióxido de carbono . Segundo o relatório Stern do último outono sobre a economia da alteração climática, com 650 ppm, há uma chance de 60% a 95% de um aquecimento de 3°C. Noutras palavras, a meta do governo nos compromete com um nível muito perigoso de mudança climática.
Faz ao menos quatro anos que o governo britânico sabe que estabeleceu a meta errada. Em 2003, seu departamento de meio ambiente concluiu que “com uma estabilização de CO2 atmosférico de 550 ppm, a expectativa é que as temperaturas se elevem entre 2°C e 5°C”. Em março do ano passado, admitiu que “um limite próximo a 450 ppm ou mesmo mais baixo talvez seja mais apropriado para atender ao limite de estabilização em 2°C”. Mesmo assim, a meta não foi alterada.
A União Européia também sabe que está usando os números errados. Em 2005, descobriu que “para se ter uma oportunidade razoável de restringir o aquecimento global a não mais de 2°C, talvez seja necessária uma estabilização das concentrações bem abaixo de 550 ppm de equivalente em CO2. Mas seu alvo não foi mudado, também.
É constrangedor para o governo e para esquerdistas como eu o fato de que a única grande entidade política no Reino Unido que parece capaz de contestar isso é o Partido Conservador britânico, de oposição. Num documento publicado no mês passado, o partido exigiu uma meta de estabilização atmosférica de 400 ppm a 450 ppm de equivalente em CO2. Será que isso se transformará numa política do governo?
No meu livro Heat (Aquecimento), calculo que, para evitar o aquecimento de 2 graus, requer-se um corte das emissões globais de 60% per capita entre agora e 2030. Isso se traduz numa redução de 87% no Reino Unido. Uma meta muito mais rigorosa que a do governo britânico, que requer redução de 60% nas emissões no Reino Unido em 2050. Porém, meus cálculos parecem ter sido subestimados. Documento da revista Climatic Change ressalta que a sensibilidade das temperaturas globais às concentrações de gás efeito estufa permanece incerta. Mas, se usarmos o número médio, para termos 50% de chance de impedir um aquecimento superior a 2°C, é preciso uma redução global de 80% em 2050.
Esse é um corte no total das emissões, e não nas emissões per capita. Se a população mundial passar de 6 bilhões para 9 bilhões entre agora e 2050, precisaremos de uma redução das emissões globais de 87% por pessoa. Se as emissões de carbono forem distribuídas igualmente, o corte maior deve ser feito pelos maiores poluidores - nações ricas como nós. Assim, as emissões per capita do Reino Unido precisariam cair 91%.
Mas nossos governos parecem ter, disfarçadamente, abandonado sua meta de prevenir alterações climáticas perigosas. Se assim for, eles condenam milhões de pessoas à morte. O que o relatório da IPCC mostra é que temos que parar de tratar as mudanças climáticas como uma questão urgente. Temos que começar a tratá-las como uma emergência internacional.
Temos que abrir imediatamente negociações com a China, que ameaça se tornar a maior emissora de gases de efeito estufa do mundo em novembro próximo, em parte porque fabrica muitos dos produtos que compramos. Precisamos calcular quanto custaria para descarbonizar sua crescente economia e ajudar a pagar por isso. Precisamos de uma grande ofensiva diplomática, muito mais premente, para convencer os Estados Unidos a fazer o que fizeram em 1941 e transformar a economia. Mas, acima de tudo, temos que mostrar que continuamos levando a sério o combate às mudanças climáticas, estabelecendo as metas exigidas pela ciência.